POLIS

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O projeto nasce com foco no comportamento político nas sociedades contemporâneas e nos efeitos dos movimentos sociais e políticos atuais sobre as liberdades e processos emancipatórios, bem como seus impedimentos em escala local, nacional e global. Tem por objetivos o desenvolvimento de um campo interdisciplinar de reflexão e prática investigativa e divulgadora, reunindo debates em torno de questões como: preconceito, racismo, sexismo, xenofobia, movimentos sociais, violência coletiva social, relações de poder, movimentos emancipatórios de povos e nações, valores democráticos e autoritarismos, laicidade, análises de discursos e ideologias, de universos simbólicos e práticas institucionais. Nessa perspectiva, o Polis atua desde sua criação formal em 2013, como projeto de extensão e em 2015 como Blog para divulgação e atualização.

segunda-feira, 10 de maio de 2021

A quem pertence Jerusalém?

 


    A "Cidade Santa” é cenário de um antigo conflito que se atualiza com as intermináveis disputas por sua posse. Jerusalém é dos judeus ou dos árabes? A cidade localizada em um planalto nas montanhas da Judeia entre o mar Mediterrâneo e o mar Morto, uma das mais antigas do mundo, capital de facto e metrópole israelense, é acima de tudo o lar de dois povos que lutam para ter seu domínio e controle. No entanto, sabe-se que somente com um verdadeiro e aberto diálogo entre israelenses e palestinos se superaria a história de ódio dos dois povos e se retomaria a esperança de reconciliação. O controle que hoje exerce Israel sobre Jerusalém não impede que a cidade também siga sendo reivindicada por muçulmanos, que sonham em transformá-la na capital de um Estado palestino livre e soberano. O status legal da cidade é internacionalmente confuso; Jerusalém deveria ser administrada pelas Nações Unidas, conforme decidido em 1947 pela Assembleia Geral da ONU. A Resolução 181 da ONU é clara sobre a divisão da Palestina em dois Estados, um judeu e outro árabe, e também previa sua manutenção sob tutela da ONU, desmilitarizada, sob controle internacional e servindo de capital aos dois novos Estados. O projeto sempre foi objeto de discórdia dos dois lados, o que incitou muita violência entre os dois grupos envolvidos no pretenso acordo, nomeadamente judeu e árabe. "Após a declaração de independência de Israel em 14 de maio de 1948, os exércitos da Jordânia, Egito, Síria, Iraque e Líbano atacaram o Estado recém-proclamado. Como resultado da guerra, Jerusalém foi dividida em uma parte oriental controlada pela Jordânia e uma parte ocidental controlada por Israel”,(1) que na Guerra dos Seis Dias, em 1967, capturou da Jordânia a parte oriental. Em 1980, o parlamento israelense, o Knesset, declarou que toda a área da cidade era a capital inseparável de Israel. O Conselho de Segurança da ONU considerou essa anexação nula e sem efeito na Resolução 478 e desde então vem confirmando a decisão. 


A Organização para a Libertação da Palestina, OLP, proclamou o Estado da Palestina em 1988 e declarou Jerusalém sua capital. A Jordânia já havia desistido de sua reivindicação de Jerusalém Oriental e dos territórios palestinos mais amplos. No decorrer da reaproximação entre israelenses e palestinos, a questão do status final de Jerusalém foi deixada de lado. O tratado de paz de Oslo de 1993 estipulou que deveria haver um tratado separado sobre isso mais tarde. 136 de 193 membros da ONU reconheceram um Estado da Palestina com Jerusalém como sua capital.(2)


No governo Trump, a definição do status de capital para ambos os Estados ficou ainda mais distante de ser conseguida, pois o nomeado presidente aprovou a transferência da Embaixada estadunidense para Jerusalém, o que indiretamente significou o reconhecimento da cidade como legítima capital de Israel. Um acordo israelita-palestino sobre Jerusalem continua sendo  fundamental para a solução da criação de dois Estados soberanos e para tentar resolver o conflito no Oriente Médio. No entanto, com a decisão unilateral do governo estadunidense de reconhecer Jerusalém como a capital de Israel, cidade que está na alma e no coração dos dois povos, os ânimos se acirraram e foi reacendida a disputa pela cidade, trazendo desesperança sobre a possibilidade de uma reconciliação internacionalmente almejada e contribuindo para o acirramento dos conflitos locais com a escalada da violência que torna a vida da população ainda mais dura.

Em 10 de maio de 2021, registraram-se distúrbios violentos em Jerusalém. Trata-se de um confronto no Monte do Templo, que para Israel é o Har Habayt (Monte do Templo) e para os árabes é a Esplanada das Mesquitas (Haram esh-Sharif). A organização governante da Faixa de Gaza retaliou o que chamou de agressão aos árabes de Jerusalém disparando foguetes em direção à Cidade Santa, que logo foram reivindicados pelo Hamas como uma reação ao "crime e agressão" israelenses. Os confrontos entre palestinos e forças de segurança israelenses desde a manhã dessa segunda-feira já causaram ferimentos em mais de 300 pessoas, segundo a organização humanitária Crescente Vermelho Palestino. Mais de 200 pessoas foram levadas ao hospital. De acordo com a polícia israelense, 21 policiais ficaram feridos nos confrontos.

A escalada da violência já vem ocorrendo há semanas. Além dos feridos, há registo de várias mortes em ataques. No foco do conflito também a disputa por terras no distrito de Sheikh Jarrah em Jerusalém Oriental. Para muitos, essa disputa simboliza uma expulsão contínua dos árabes da cidade. O Monte do Templo abriga a Cúpula da Rocha, a Mesquita de Al-Aqsa e o Muro das Lamentações e desempenha importância central no islã e no judaísmo. Para Israel, os ataques feitos pela Hamas a partir da Faixa de Gaza se configuram como uma  justificativa para sua reação com ataques aéreos contra posições do grupo militante palestino. “De acordo com as autoridades na Faixa de Gaza, nove pessoas foram mortas durante os ataques de retaliação israelenses, entre eles, um comandante de alto escalão do Hamas e seus três filhos. Grandes incêndios no Monte do Templo em Jerusalém foram relatados anteriormente ao ataque, o que se diz ter ocorrido durante novos confrontos entre as forças de segurança israelenses e combatentes palestinos.”(3)

Tudo isso ocorre no mês de jejum do Ramadã, quando dezenas de milhares de muçulmanos se reúnem no Monte do Templo para orar. Na manhã de segunda-feira dia 10 de maio, de acordo com a polícia israelense, alguns ativistas atiraram pedras do Monte do Templo em direção a uma rua; ao mesmo tempo uma posição policial também foi atacada, o que levou as forças de segurança a invadir a área imediatamente após esses eventos. “Muitos muçulmanos em todo o mundo mostram solidariedade com o lado palestino. Muitas fotos e vídeos são espalhados nas redes sociais sob a hashtag al-Quds tantafid, que significa ‘Intifada de Jerusalém’. Vários governos estão alimentando ativamente o conflito, especialmente a Turquia: ‘Israel deve parar de atacar os palestinos em Jerusalém’, disse um porta-voz do governo na segunda-feira”.(4)

Uma marcha de milhares de israelenses de direita por ocasião do Dia de Jerusalém de Israel, no qual se festeja a captura de Jerusalém Oriental em 1967, para a tarde de segunda-feira foi   cancelada no último minuto. Vale lembrar que tudo isso ocorre no momento em que a oposição israelense está tentando formar um novo governo e que, caso consiga, levará o partido Likud do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu para a oposição.   

Diferentemente de seu antecessor, Donald Trump, o presidente Joe Biden, mais crítico da direita israelense com seus laços estreitos com o movimento dos colonos, vem expressando “sérias preocupações sobre os possíveis despejos de famílias palestinas de suas casas no distrito de Sheikh Jarrah”.

O mundo volta suas atenções para o que ocorre em Jerusalém. Além das preocupações expostas pelo presidente Biden, outros governantes se mobilizam e reagem aos acontecimentos na cidade pomo da discórdia entre judeus e árabes. Por razão do conflito atual que assola as ruas da cidade, o Ministério das Relações Exteriores da Jordânia convocou o encarregado de negócios de Israel no país. O secretário-geral da ONU, António Guterres exortou Israel a exercer “o máximo de contenção”. Segundo reportagem do jornal Times of Israel, o Conselho de Segurança da ONU tratará da situação em Jerusalém. Em Berlim, o porta-voz do governo de Angela Merkel, Steffen Seibert, afirma que o governo alemão também convocou todos os envolvidos a exercer o senso de proporção e moderação. Em sua típica postura de interventor, o chefe do Estado turco, Recep Tayyip Erdogan, descreveu Israel como um "Estado terrorista cruel”, afirmando que as ações de Israel são um ataque a todos os muçulmanos, contudo sem apresentar qualquer recurso ou desejo de negociação, apenas justificando e apelando para a retaliação muçulmana.

“Estou com raiva e triste”, diz um jovem palestino. “Este é o meu bairro. Não o deles. E agora eles vêm e querem tomar nossas casas.”(5) Judeus e muçulmanos vivem no bairro árabe de Sheikh Jarrah, em Jerusalém Oriental, a que se refere o jovem palestino. A rua Othman-Ben-Afan é um exemplo dessa convivência nada pacífica. Nela veem-se casas de famílias palestinas às vezes intercaladas por outras de famílias judias. De um lado da rua, palestinos que se postam em frente a uma casa prestes a ser despejada, do outro lado colonos nacionalistas de direita em frente a outra, onde antes viviam palestinos e agora está ocupada por israelenses.  Ambos reivindicam o bairro para si e se dizem prontos a lutar por ele. Há precedentes para despertar a cobiça dos judeus de um lado e o ódio palestino do outro, uma vez que o tribunal distrital de Jerusalém havia decidido que as casas das famílias palestinas pertencem legitimamente a famílias judias. “De acordo com a lei israelense, os judeus israelenses podem reivindicar a propriedade de casas em Jerusalém Oriental no tribunal se seus ancestrais possuíssem terras lá antes da Guerra Árabe-Israelense (1948-49).”(6) Uma afronta aos palestinos, que também perderam suas propriedades como resultado da guerra e para quem não há nenhuma lei semelhante ou correspondente. As Nações Unidas também questionam essa legislação ao afirmar que os despejos não se justificam e devem ser cancelados. 

Toda a revolta que se registra nesse mês do Ramadã eclode a apenas um quilômetro de Sheikh Jarrah, na cidade velha de Jerusalém. Sheikh  Jarrah não é qualquer bairro, é para muitos um símbolo da expulsão dos muçulmanos de Jerusalém. Palestinos são expulsos de suas casas, onde vivem com suas famílias sob permanente ameaça de despejo.(7) A lei israelense de reivindicação de propriedade é, para grupos de direitos humanos, discriminatória, pois falta aos palestinos que perderam suas propriedades no que hoje corresponde ao território israelense uma legislação que lhes proporcione direitos semelhantes.   


Antonio Caubi Ribeiro Tupinambá

Fortaleza, 10 de maio de 2021


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(1) Wem gehört die Heilige Stadt? Sechs Fragen zum Status Jerusalems. Disonível em: <https://www.dw.com/de/wem-geh%C3%B6rt-die-heilige-stadt-sechs-fragen-zum-status-jerusalems/a-41673866>. Acesso em: 10 mai. 2021.

(2) idem

(3) Schimid, M.: Kathe, S. Mindestens 20 Tote bei Vergeltungsschlag – Israel tötet drei Aktivisten der Hamas. Disponível em: <https://www.fr.de/politik/konflikt-israel-palaestina-ost-jerusalem-polizei-blendgaranaten-steine-90529677.html#>. Acesso em: 10 mai. 2021.

(4) Lage in Nahost spitzt sich zu. Disponível em: <https://taz.de/Israel-Palaestina-Konflikt/!5766296/>. Acesso em: 10 mai. 2021.

(5) Hammer, B.  "Das ist meine Nachbarschaft". Disponível em: <https://www.tagesschau.de/ausland/ost-jerusalem-sheikh-jarrah-101.html>. Acesso em 10 mai. 2021.

(6) Unruhen erschüttern Tempelberg in Jerusalem. Disponível em: <https://www.dw.com/de/unruhen-erschüttern-tempelberg-in-jerusalem/a-57468130>. Acesso em: 10 mai. 2021.

(7) Häuserkampf in Jerusalem. Disponível em:  <https://taz.de/Auseinandersetzungen-in-Israel/!5766297/>. Acesso em: 10 mai. 2021.

quarta-feira, 5 de maio de 2021

Há um futuro para a Colômbia?

 




    Em 2018 mais de uma centena de pessoas ligadas aos Direitos Humanos foram assassinadas na Colômbia, tendência que se manteve em 2019 e no ano seguinte. Este número chega a 115 ativistas de movimentos sociais assassinados,  segundo a ONU — Direitos Humanos na Colômbia(1), caso se considere todo o ano de 2018,  número que cresceu para 120 em 2019. Já em 2020 se registou o maior número de massacres no país desde 2014, segundo a representante na Colômbia do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos — ACNUDH.(2) Dados assustadores e que demonstram um grave revés nas esperanças de um tratado de paz e no fim da violência histórica costumeira na sociedade colombiana. Em 2021 o país volta às manchetes mundiais por conta de mais um massacre que se avizinha com a reação desmedida das forças de segurança do governo frente aos protestos de populares contra a reforma tributária em curso. Até segunda-feira, 3 de maio de 2021 "o Comitê Nacional de Greve já contava um total de 27 mortos e 124 feridos pela repressão das forças de segurança entre 28 de abril a 2 de maio. De acordo com o grupo, ao menos 1.089 casos de violência policial foram registrados e, entre os manifestantes assassinados, 12 deles foram mortos em Cali. O indício é que a cifra de mortos e feridos seja ainda maior".(3)  Em 2 de maio, o presidente colombiano, Iván Duque anunciou a retirada da polêmica proposta tributária, que favorecia abertamente os ricos e colocava pressão extra sobre as classes trabalhadoras e média. Nessa mesma data o ministro das Finanças, Alberto Carrasquilla, apresentou sua renúncia. Apesar disso, os protestos iniciados em 28 de abril continuaram. Protestos pacíficos tomaram as ruas das grandes cidades do país, com a participação de professores, estudantes universitários, sindicatos, grupos afro-colombianos e indígenas e muitos outros que se posicionam contra as medidas do governo de extrema-direita. Milhares de colombianos ocupam as ruas de grandes cidades, como Bogotá, Medellín e Cali, mas também estão presentes em outras cidades menores por toda a grande nação dos Andes. Confrontos violentos com a polícia foram vistos, principalmente mas não somente, na cidade de Cali, onde um grupo de indígenas derrubou uma estátua do colonizador espanhol fundador da cidade. Sebastián de Belalcázar foi ao chão pela segunda vez em menos de um ano. A estátua do conquistador espanhol foi derrubada, desta feita, por um grupo de indígenas Misak, que se manifestaram na cidade no âmbito da greve nacional convocada por diferentes organizações sociais para rejeitar a reforma tributária do Governo de Iván Duque. "O Movimento de Autoridades Indígenas do Sudoeste defendeu sua ação desta forma: 'Derrubamos Sebastián de Belalcázar em memória de nosso cacique Petecuy, que lutou contra a coroa espanhola, para que hoje, nós, seus netos e netas, continuemos lutando para mudar este sistema de Governo criminoso que não respeita os direitos da mãe terra’".(4) Na capital Bogotá os atos ocorreram de forma pacífica, com bloqueios de ruas e estações, apesar dos pedidos feitos por políticos para que a população evitasse aglomerações neste momento de pandemia. Sob forte chuva, helicópteros da polícia e gás lacrimogêneo lançado pela tropa de choque tentavam dispersar os manifestantes. Durante várias horas, a polícia fez inúmeras tentativas para dispersar as pessoas que protestavam nas ruas.


A estátua de Sebastián de Belalcázar, um conquistador espanhol do século XVI, jaz depois de ter sido derrubada por indígenas em Cali, na Colômbia. PAOLA MAFLA / AFP



Quais são as perspectivas futuras no país que desde a assinatura do tratado de paz entre governo e a ex-organização guerrilheira FARC, em novembro de 2016, vê uma nova onda de violência estatal e paraestatal assolar ativistas de movimentos sociais, atingindo principalmente seus sindicatos? "Em agosto de 2017, a polícia matou três pessoas como parte da repressão brutal de uma greve de um mês de mais de 20.000 mineiros no noroeste da Colômbia contra a mineradora canadense Gran Colombia Gold. Algumas semanas depois, unidades militares e policiais realizaram um massacre durante os protestos de pequenos proprietários no sudoeste da Colômbia. A polícia colombiana e unidades militares ainda invadem vilarejos em áreas rurais e matam impunemente. Em 2018, houve uso repetido de força letal pelas forças de segurança do Estado contra grupos populacionais que saiam às ruas protestando contra o governo".(5)

O nomeado acordo de paz entre o governo colombiano e os guerrilheiros das FARC no final de 2016 levou ao fim de uma guerra civil extremamente prolongada e atraiu grande atenção internacional, rendendo ao presidente colombiano Juan Manuel Santos o Prêmio Nobel da Paz, sem contudo resultar em uma nova sociedade nos anos pós conflito. Vários atores violentos que pertencem a grupos paramilitares, cartéis de drogas, a organizações guerrilheiras seguem atuando. Por outro lado, um grande número de causas de conflito continua sem vislumbrar qualquer solução para que sejam superadas e, desse modo, se alcance maior segurança na sociedade. Os desafios centrais dizem respeito a lidar com várias questões de justiça em um período de transição, conseguir uma reconciliação com o passado e, de forma mais geral, criar a estrutura para "uma sociedade pacífica, socialmente justa e sustentável". Na contramão dessas necessidades, as políticas do governo fascistóide do atual presidente Duque acirram o desequilíbrio econômico e social, além dele preferir o confronto a ter que negociar com setores da sociedade civil. "A violência contra os sindicalistas também não termina. Em 2018, a Colômbia ainda apresentava o maior índice de homicídios sindicalistas do mundo. E a impunidade maciça para crimes violentos em geral e crimes violentos contra sindicalistas em particular também não mudou”.(6)

Desde cedo, defensores de direitos humanos viam um panorama de pessimismo com a chegada ao poder do presidente Duque, que de fato foi o responsável pelo agravamento dos problemas de conflito armado no país. Uma decepção para a parte da população que apostava nos acordos estabelecidos durante o governo anterior e neles via uma oportunidade de finalmente se alcançar a paz em um país habituado mas não conformado com a guerra. Duque está a frente de um governo com apenas 33% de aprovação e que mergulha em uma nova crise com a atual onda de protestos contra seu pacote de reformas trabalhistas e providenciarias e com insatisfação da população que se agrava com a forma ineficaz com que é conduzida a pandemia de covid 19. Enquanto permanecem nas ruas, os manifestantes também cobram por vacinação em massa contra a covid-19, renda básica universal e subsídios às pequenas empresas. A população também exige que o governo defenda os empregos e a produção nacional e proíba o envenenamento da lavoura por meio da sua pulverização aérea com agrotóxicos letais. Trata-se de um governo que reprime o direito legítimo de manifestação e protesto e joga  grande parte da população na pobreza, enquanto mantém o privilégio de poucos. Os colombianos estão dizendo “basta" e vendo, na iminência de mudança de governo acompanhado por um novo paradigma político nas próximas eleições, a única saída para a atual situação de desmonte do Estado e descaso com a população. Uma tentativa para prorrogar o mandato do atual presidente por mais dois anos foi condenada por uma aliança entre sete partidos e movimentos progressistas, que qualificou essa pretensão como uma maneira de dar um golpe nas instituições e no processo democráticos de eleição popular. 

Segundo o senador do Polo Democrático Alternativo Ivan Cepeda há, a partir dos políticos de esquerda, uma proposta de país a ser colocada em pauta e em prática. Trata-se de um modelo que compreende uma reforma agrária para ajudar a resolver "'o problema do narcotráfico, já que estão intrinsecamente unidos; uma reforma tributária, que permita arrecadar fundos para transformar o Estado em um Estado social; e uma reforma energética e climática, para resolver a questão da dependência energética da Colômbia do extrativismo mineiro e do petróleo’. O programa não descarta a convocação de uma Assembleia Constituinte, para desmontar o estado militar. Cepeda também não descarta uma aliança com o partido Comunes, formado por ex-guerrilheiros das Farc'".(7)

Álvaro Uribe, que foi presidente da Colômbia entre 2002 e 2010, continua sendo uma figura proeminente no país e pertence ao mesmo partido do atual presidente Duque, segundo Cepeda, um "inimigo da paz”. Iván Duque também é responsável pela "morte de líderes populares que denunciam violações ao acordo, 'com a cumplicidade de agentes estatais', e se esforça para acabar com o seu progresso, algo que só não conseguiu devido ao apoio da população ao acordo e da forte influência internacional no país em prol da paz”.(8)

Como acontece no Brasil,  para se redemocratizar o país é necessário barrar, com a força das urnas, a reeleição do atual presidente. Para impedir a continuação de um governo que destrói o país e os direitos da população e que também tenta criar um Estado antidemocrático, a Colômbia precisa unir as forças políticas de diferentes matizes e pelo voto popular derrotar a herança de Uribe e seus representantes atuais, elegendo um presidente e uma base parlamentar majoritária para garantir a governabilidade do novo mandatário. Para o senador Cepeda, a oportunidade de mudar a realidade cruel de sucessivos governos de direita e extrema direita surge com o atual descontentamento da população. Esse sentimento de descontentamento com o governo, por razões óbvias, nunca foi tão forte e tem se agravado por conta das péssimas e ineficazes estratégias de combate à pandemia. Como sugere o senador, somente com a construção de uma frente única de esquerda pode-se superar o atual governo neo-liberal e antidemocrático e evitar sua volta ao poder no próximo pleito. 


Antonio C. R. Tupinambá

Fortaleza, 4 de maio de 2021.

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1) La impactante violencia en Colombia contra los defensores de los derechos humanos causa preocupación. Disponível em: <https://news.un.org/es/story/2020/01/1467912>. Acesso em: 4 mai. 2021.

2) 2020, el año con más masacres en Colombia de los últimos 6. Disponível em: <https://www.semana.com/nacion/articulo/2020-el-ano-con-mas-masacres-en-colombia-de-los-ultimos-6/202100/>. Acesso em: 4. mai. 2021.

3)  ‘Colombiano clama por comida, saúde e educação e governo responde a bala’. Disponível em: <https://www.redebrasilatual.com.br/mundo/2021/05/protesto-colombia-governo-ivan-duque/>. Acesso em 4 mai. 2021.

4)  Torrado, S. Indígenas derrubam estátua de colonizador espanhol em protestos contra as reformas na Colômbia. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/internacional/2021-04-28/indigenas-derrubam-estatua-de-colonizador-espanhol-em-protestos-contra-as-reformas-na-colombia.html>. Acesso em: 4 mai. 2021.

5)  Neißl, N. Kolumbien: Kein Ende der Gewalt in Sicht. Disponível em: <https://awblog.at/kolumbien-kein-ende-der-gewalt/>. Acesso em: 4 mai. 2021.

6) Peters, S. Der Friedensprozess in Kolumbien naco den Präsidenschaftswahlen: Bilanz und Perspektivenhttps. Disponível em: <//www.instituto-capaz.org/en/der-friedensprozess-in-kolumbien-nach-den-prasidentschaftswahlen-bilanz-und-perspektiven/>. Acesso em 4 mai. 2021.

7)  Alvarenga, C. ‘Existe uma democracia simulada na Colômbia’, diz Ivan Cepeda. Disponível em: <https://operamundi.uol.com.br/20-minutos/69288/existe-uma-democracia-simulada-na-colombia-diz-ivan-cepeda>. Acesso em 4 mai. 2021.

8)idem.


domingo, 2 de maio de 2021

A POESIA NO TAJ MAHAL






"Sarita e Arkht" nossos protagonistas do seriado netflix "Taj Mahal 1989" (1). Um casal inter-religioso, ela hindu e ele muçulmano.



“Não achamos o amor onde procuramos”



Tudo o que pode se amar e se odiar no país, para mim, mais fascinante daquela região asiática se encontra, figurativamente, nessa short story dividida em pequenos e poucos capítulos, que podem ser vistos de uma ou duas vezes.

A riqueza das especiarias que ainda hoje estão por aqui levaram os portugueses a navegar por "milhas e milhas a qualquer lugar”, conquistar o mundo, com sua rota pioneira à Ásia, como os primeiros europeus a chegar a países no Oriente.

A beleza autêntica das vestimentas que se somam às ainda mais belas formas de pratos e menus e, no filme, aos arroubos filosóficos existenciais em uma mescla de pensamento ocidental e oriental só resultam em fascínio.



                                                            Taj Mahal - Agra (Índia)

 As paisagens vão desde os templos e palácios imponentes, aos vilarejos com suas choupanas, ou à sarjeta das grandes cidades com seu lúmpen em abundância, parte inseparável dessa paisagem. Pauperização e servidão humana se misturam a ricos filigranas que enfeitam objetos, tornam singelos os movimentos e belos os diálogos. Enfim, um complexo emaranhado que revela a dimensão da nação indiana, a resistência de sua cultura mesmo depois da devastação dos colonizadores britânicos, cuja presença se faz sentir em certas "impurezas" que restaram na língua.

Costumes e religião permeiam os diálogos, os muitos gestos e rituais, sejam eles sacros ou profanos. O machismo sustentado pela cultura milenar, exacerbado pela presença colonial continua a definir as relações sociais com forte segregação e submissão feminina. No entanto há também, nesse mosaico cultural, a esperança e o respeito das relações inter-religiosas pouco vistas nesse mundo acostumado ao sectarismo.

Misturam-se, portanto, a singeleza de gestos e hábitos cultivados, a preocupação em manter o belo acima da decadência urbana e muitas vezes humana, ainda que em cenários reveladores de empobrecimento, desigualdade; pouco caso aos desvalidos e aceitação da miséria para muitos e poder para alguns como um fato, um destino. 

Não se perde o fascínio nessas adversidades e desequilíbrio social. 

Diálogos embebidos em poesias, filosofia e pragmatismo; a vida acadêmica sempre presente, amizades e romances à indiana se sobressaem na história às vezes entremeada por pequenos lances de narrativas, dando-lhe um toque bollywoodiano.



Cores, paladares, odores, sentidos que afloram nesse enredo;  fotografias realistas, em movimento, passando pela arquitetura, riqueza e miséria, ruas, casas, vielas, jardins e palácios que enchem os olhos. 

Viaja-se com os personagens por diferentes cidades indianas com registro da vida como ela é, distante da vida como o turista vê.

Um professor de filosofia com uma pena que também cria a poesia e está casado com uma professora de física que apenas repete cálculos enfadonhos para alunos desinteressados, tem a missão de reavivar um casamento falido. Um outro filósofo “medalhista de ouro”, que pelo desemprego vira alfaiate, vive com uma ex-prostituta e traz na sua história a esperança da superação que contradiz seu destino. A menina comunista que vence a acirrada corrida pela presidência do grêmio universitário e o vence para um machista irremediável e egocêntrico que tinha o apoio da máfia local. 

Exemplares e exemplos de uma Índia dos anos 1980, seu ritmo e seus rituais de sobrevivência. 

Diferentemente da ideia que a medíocre imprensa nacional brasileira e os fascistas fazem romantizando a volta do fogão à lenha, nessa short story o chá que se oferece às visitas é aquecido na brasa e significa autenticidade, tradição e necessidade. 

A riqueza da cozinha indiana penetra os mais remotos rincões e, quando há o que fazer, o que há se transforma, magicamente, em imagens gastronômicas que enchem os olhos e aguçam o paladar. 

Há, na opressão introjetada, os contrastes fortes, muitas vezes extremos entre singeleza e arrogância, consideração e desprezo, amor e ódio que se intercalam e emergem nos diversos temas presentes e tratados no filme.

A venda de meninas para o mercado de prostituição, o machismo impregnado que leva à mutilação e à morte, a falta de perspectivas de vida e de futuro desenham um mundo para muitos apenas selado em um destino imutável e inexorável. Tudo se opondo ao aroma e à beleza da gastronomia milenar, à magnitude da arquitetura, à arte   deslumbrante, aos recantos sagrados de deusas e deuses, à leveza gestual, ao doce idioma que sempre remete a nomes e gosto de frutas, à forma e ao cheiro de flores; à estética da beleza transcendente, à sutileza no amor, às vezes tímido, outras platônico.

Para quem espera linearidade, cronicidade e “ocidentalização”, desaconselho. A Índia não é para iniciantes. Ainda assim, para esses, espero que assistam e consigam perceber que o mundo, nesse caso não é, ao contrário do que se diz, “un pañuelo”. O belo vai além do que se limitou como tal entre Roma e Atenas, ou do que é visto por olhos ocidentais viciados e prepotentes. 

Como disse nosso professor Sudakha Mishar em sua primeira aula na universidade de Lucknow, onde se passa a maior parte da história: “A compreensão é binária, 0 ou 1. Compreende-se ou não”. Isso também pode valer para quem quer compreender a Índia.


Antonio C. R. Tupinambá

Fortaleza, 2.05.2021.


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(1) Taj Mahal 1989 é uma série indiana de comédia e romance na web, dirigida e escrita por Pushpendra Nath Misra. A série é estrelada por Neeraj Kabi, Geetanjali Kulkarni, Sheeba Chaddha e Danish Husain

sábado, 1 de maio de 2021

Chade: insurgência, agitação e instabilidade

 

    Por quase quatro décadas o Chade viveu nas garras de dois sanguinários presidentes. Idriss Deby governou o país até o mês de abril de 2021 e seu antecessor, Hissène Habré de 1982 a 1990. Habré chegou ao poder depois de derrubar o então presidente do país Goukouni Oueddei com a tácita ajuda da França e dos Estados Unidos, que patrocinaram o golpe de Estado, fornecendo armas, recursos financeiros e treinamento militar para suas tropas. "Habré cometeu genocídios contra tribos e etnias que lhe faziam oposição. Foi acusado de estupro, escravidão sexual e desaparecimentos, além da morte de 40 mil pessoas. Após ser deposto, foi para o Senegal, onde foi julgado e condenado à prisão perpétua". (1)

    Habré e Déby estiveram, nas últimas quatro décadas, à frente do atual Chade, que corresponde ao antigo Territoire du Tchad então incorporado como uma colônia francesa sob a federação da África Equatorial Francesa em 1910. Durante seus longos mandatos colecionaram mortos em seus currículos presidenciais além de transformar o Chade em um dos países mais corruptos e pobres do continente africano. Com sua política instável sempre teve ajuda da França, que fornecia a seu exército os recursos e ferramentas para o combate a rebeldes. Nas mãos de Deby e seu partido “Movimento Patriótico de Salvação”, nunca houve qualquer espaço para manifestações por parte da população, que tende a se acomodar e manter o status quo na política para evitar instabilidade no país. Além dos grandes problemas políticos internos, o Chade vive uma crise de refugiados em consequência dos ataques do grupo terrorista Boko Haram nos países vizinhos. Em sua viagem pelo país africano, o fotógrafo italiano Francesco Merlini se surpreendeu com a extrema pobreza no país e a falta de liberdade da população. O sentimento que tinha durante sua estada no Chade era de ver pessoas que apesar de extremamente pobres não abriam mão de sua dignidade: "Vi pessoas que, apesar da sua pobreza, têm uma enorme dignidade e lutam diariamente contra a escassez de recursos do seu desprovido país. O Chade é um país de contrastes onde pouquíssimos ricos vivem em casas de luxo e coexistem com pessoas que nada têm senão uma cabana feita de barro e uns grãos de milho". (2)

    O povo do Chade massacrado pela pobreza e desrespeito pertence a cerca de 200 distintas etnias. Destas, não há uma que não tenha tido entre seus membros vítimas de perseguição, prisão e tortura. Foi Hebré o comandante do episódio conhecido como “Setembro negro”, quando no início dos anos 1980 seus homens chegaram e incendiaram toda uma vila deixando um rastro de destruição e morte. Como em muitos outros países africanos, o povo do Chade, descrente das instituições, dos partidos e seus representantes, se distanciam de qualquer esperança na democracia, deixando o terreno livre para que militares justiceiros ocupem o vácuo de poder.

    O governo de Deby sempre teve o apreço do Ocidente por seu desempenho fundamental na guerra contra o terrorismo islâmico na região do Sahel.(3) Sahel, palavra árabe que significa "costa" ou "fronteira" corresponde à faixa de transição no continente africano, que separa o Deserto do Saara e a região das savanas, indo do Oceano Atlântico a Oeste e o Mar Vermelho a Leste. Trata-se de uma região semiárida se estendendo da Mauritânia ao Sudão, compreendendo partes do Senegal, Mali, Burkina Faso, Argélia, Níger, Nigéria, Chade, Camarões, Sudão do Sul, Etiópia e Eritréia. No plano internacional, principalmente os ex-colonizadores franceses davam suporte e elogiavam Deby por sua lealdade inabalável em combate a grupos como o Boko Haram, a Al Qaeda e o Estado Islâmico naquela região. Ao mesmo tempo em que recebia esse apoio à ativa participação em operações de contraterrorismo, o Ocidente ignorava a repressão e violação de direitos humanos, a crescente corrupção e desmandos no país. 

    Em N’Djamena, capital do país e em outras cidades eclodem manifestações contra mais um golpe militar, desta feita perpetrado pelo general Mahamat Idriss Deby, filho do presidente morto em consequência dos ferimentos sofridos enquanto fazia uma visita às tropas que lutavam contra rebeldes opositores ao governo no poder há mais de trinta anos. Até mesmo o governo francês, mandante colonial antes da independência do país em 1960, deixou de apoiar o autonomeado Conselho Militar de Transição — CMT e exigiu que uma unidade civil passasse a liderar o país até que sejam realizadas eleições democráticas: “Sou a favor de uma transição pacífica, democrática e inclusiva, não sou a favor de um plano de sucessão… A França nunca apoiará aqueles que buscam tal projeto”, afirmou Emmanuel Macron.

    Os abusos dos golpistas durante as manifestações de protesto ao regime que se instala no país levaram órgãos como a Anistia internacional para a África Ocidental e Central a exigir das autoridades locais e internacionais investigações imparciais e independentes sobre as circunstâncias das mortes e a consequente punição dos responsáveis pelos homicídios, além da garantia do direito a reuniões e protestos pacíficos no país. 

    Já era esperado que a morte do presidente Deby, eleito em um pleito polêmico para um sexto mandato, resultasse no retorno do país a um estado de violência e caos. 

   O grupo de rebeldes que formam a Frente para Mudança e Concórdia no Chade — FACT tem o poder de ameaçar qualquer estratégia para se conquistar certa estabilidade no Chade e na região, caso não se respeitem as regras democráticas do jogo de mudança de poder. Trata-se do mesmo grupo ao qual se atribui as ações que feriram o presidente Deby levando-o posteriormente a óbito. "O grupo, que foi formado por militares dissidentes em 2016 e não está ligado a grupos jihadistas, agora prometeu depor o jovem Deby, dizendo: 'O Chade não é uma monarquia. Não pode haver devolução dinástica de poder em nosso país.’" Um porta-voz do grupo disse: "Pegamos em armas porque não havia espaço democrático no Chade. Não era possível imaginar uma solução pacífica. Vimos que Deby não queria sair do poder. Não queremos tomar o poder para segurar poder. Nosso objetivo é que as transições democráticas sejam uma realidade". Há também grande inconformismo e insatisfação com o Conselho Militar de Transição liderado pelo filho do ex-presidente por parte dos políticos de oposição. Muitos desses políticos já haviam boicotado a eleição e reclamaram de repressão durante a campanha antes da votação, além de continuar exigindo o retorno ao governo civil. Succes Masra, líder do partido de oposição “Transformers" também rejeita o Conselho Militar de Transição e afirma: "Os chadianos querem uma transferência dinástica de poder? Não. Os chadianos querem a continuação do sistema Deby que eles rejeitaram? Aparentemente não. Os chadianos querem o caos e o conflito armado até que chegue a um fim amargo? Aparentemente não. Mas há também uma abordagem mais inteligente, um caminho de inteligência coletiva que inclui o povo chadiano”. Para isso acrescenta que o exército será mais forte e mais necessário se ficar no quartel e permanecer neutro, pois somente assim garantirá a segurança do país e também contribuirá na luta contra o terror.

    O Chade desempenhou um papel fundamental na guerra do Ocidente contra o terrorismo islâmico na região do Sahel e foi elogiado pela França por sua lealdade inabalável em grupos de combate contra o Boko Haram, a Al Qaeda e o Estado Islâmico.

    Ainda assim, como a Human Rights Watch — HRW disse em um comunicado, "por anos, atores internacionais apoiaram o governo de Deby por seu apoio às operações de contraterrorismo, enquanto fechavam os olhos para seu legado de repressão e violações de direitos sociais e econômicos em casa”. A comunidade internacional não pode continuar desviando seus olhos dos grandes problemas que assolam a política interna do país, a falta de democracia, o crescimento da corrupção e a constante prática de desrespeito aos direitos humanos, simplesmente porque o governo ilegítimo que se forma com o novo presidente interino, para se fazer aceito principalmente pela França e Estados Unidos, afirma que o país continuará assumindo seu papel e suas responsabilidades na luta contra o terrorismo.

    O que se tem notícia é da grande incerteza do que se seguirá aos atuais acontecimentos no Chade. Há dúvidas sobre o grau de lealdade que demonstrará o exército ao filho do ex-presidente Deby e a força que terá para evitar o avanço dos rebeldes, que ameaçam chegar à capital do país para tentar depor o novo mandatário, visto por eles como um golpista. Pode ser que a insatisfação do povo do Chade com o domínio ininterrupto durante 30 anos do seu último presidente, o levem a uma aliança com aqueles que exigem uma mudança de liderança de facto no país. Como afirma Cameron Hudson, membro  do Centro Africano do Conselho Atlântico, "qualquer dos cenários apresenta um elevado risco de baixas civis e uma probabilidade de que a fuga de civis ou soldados possa exportar a instabilidade do Chade para estados vizinhos”. (7)


Antonio C. R. Tupinambá

Fortaleza, 1o de maio de 2021.


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1)https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/ditadores-sanguinarios-de-que-ninguem-se-lembra.phtml

2)https://www.publico.pt/2016/01/15/p3/fotogaleria/chade-um-dos-paises-mais-pobres-e-corruptos-do-mundo-385574

3) "Sahel, Sāḥil árabe, região semi-árida da África ocidental e centro-norte que se estende do Senegal ao leste até o Sudão. Forma uma zona de transição entre o árido Saara (deserto) ao norte e o cinturão de savanas úmidas ao sul. O Sahel se estende do Oceano Atlântico ao leste através do norte do Senegal, sul da Mauritânia, a grande curva do rio Níger no Mali, Burkina Faso (antigo Alto Volta), sul do Níger, nordeste da Nigéria, centro-sul do Chade e no Sudão." Disponível em: <https://www.britannica.com/place/Sahel>. Acesso em: novembro de 2020.

4) https://www.dw.com/en/chad-anger-and-uncertainty-as-slain-presidents-son-named-interim-leader/a-57280756

5)idem

6)ibdem

7)https://www.rtp.pt/noticias/mundo/rebeldes-ameacam-depor-filho-de-presidente-do-chade-que-assumiu-poder-apos-morte-do-pai_n1314002