POLIS

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O projeto nasce com foco no comportamento político nas sociedades contemporâneas e nos efeitos dos movimentos sociais e políticos atuais sobre as liberdades e processos emancipatórios, bem como seus impedimentos em escala local, nacional e global. Tem por objetivos o desenvolvimento de um campo interdisciplinar de reflexão e prática investigativa e divulgadora, reunindo debates em torno de questões como: preconceito, racismo, sexismo, xenofobia, movimentos sociais, violência coletiva social, relações de poder, movimentos emancipatórios de povos e nações, valores democráticos e autoritarismos, laicidade, análises de discursos e ideologias, de universos simbólicos e práticas institucionais. Nessa perspectiva, o Polis atua desde sua criação formal em 2013, como projeto de extensão e em 2015 como Blog para divulgação e atualização.

sexta-feira, 29 de setembro de 2017

O massacre aos índios isolados da Amazônia brasileira




O massacre aos índios isolados da Amazônia brasileira
Antonio C. R. Tupinambá
Fortaleza, 27 de setembro de 2017.

Setembro é o mês de comemoração da independência do Brasil. Exatamente neste mês, o povo dono legítimo da terra, ainda remanescente, sofre um dos piores massacres registrados na historia recente da região amazônica. Não por acaso isso ocorre nos dias atuais em um país sem rumo político e em profunda crise moral e institucional. A Fundação Nacional do Índio (Funai), órgão federal que deveria servir para proteger a população originária vem sendo, pouco a pouco, loteada por incompetentes administradores de vocação duvidosa, com viés de exploração em benefício próprio e de seus grupos além de descarado proselitismo a partir da via institucional. Missões evangélicas, pressionam o governo para ter acesso às aldeias e agir para distruir culturas e povos. Na Funai a disputa pela sua presidência é rifada a favor do partido de fundamentalistas evangélicos, o PSC, que jamais atuou em defesa dos índios e apenas busca essa “fatia de mercado humano” para diversificar seus “negócios”, aumentar seus dízimos e poder. Nessas maldades travestidas de religião o céu é o limite. Basta ver os nomes de generais anti-indigenistas indicados pelo “partido" para liderar o órgão.
A pátria que se intitula cristã mostra-se cada vez mais contraditória, muitas vezes cruel e com atitudes de desrespeito e intolerância. Não é apenas nas favelas cariocas entre “traficantes evangélicos” destruidores de dignidade, terreiros e crenças, que essa brutal contradição se materializa. Eventos recentes de ataques a locais e objetos de religiões e cultos de matriz africana em favelas cariocas é a expressão máxima de atitudes nefastas de pessoas delinquentes que ousam se intitular “cristãs”. Reflexo de discursos e ações de setores da população capitaneados, por exemplo, pela aberrante “bancada evangélica” de Brasilia e suas similares em outros níveis de poder local, sejam em assembleias ou câmaras, com iguais comportamentos e ética duvidosos.
Na Amazônia, a exemplo dos demais retrocessos da nação, se testemunhou nesses últimos dias atos destrutivos de “não índios” e “bons cristãos” contra irmãos indígenas, bem no modelo do Brasil colônia, quando esses eram “caçados, adestrados ou escravizados" em nome da igreja e da coroa. Pouco evoluiu ou mudou nesse campo com o passar dos séculos. Torçamos para que movimentos sociais cobrem o respeito à cultura e à vida desses grupos de indígenas que se encontram em desvantagem e, além da fuga, quase nada podem fazer para se defender desses malfeitores e seus ataques em nome de evangelização ou da ganância, ou mais comumente, dos dois.
Muitas tribos ainda relutam em se integrar ao povo que massacrou seus antepassados e deixou na memória coletiva o fantasma da perseguição. Sabe-se pouco acerca desses povos isolados, no entanto é certo que o desejo de assim permanecerem é, muitas vezes, explicado por essa memória dos tempos em que foram explorados e escravizados, mesmo em se considerando a história mais recente da região.
Ações de bandos de “não índios” em ocupação destrutiva adentram, cada vez mais, regiões dantes impensáveis, muitas delas hoje com status de reservas que deveriam ser respeitadas e mantidas à distância. A mão do Estado em forma de construtores de estradas e hidrelétricas, de políticas de loteamento da Funai para partidos suspeitos e anti-indigenistas é determinante para a perpetração impune de tais atos de violência contra os índios. O que se frisa aqui é uma interferência comparável aos atos bárbaros de colonizadores no passado, em versão atualizada e piorada, pois se trata de uma época em que se espera civilidade e respeito a terras demarcadas e protegidas legalmente. Ações que contradizem a pretensa e falaciosa postura cristã da sociedade brasileira, que se vê como sujeito de direitos e, ao mesmo tempo, vê o irmão índio, como objeto a ser manipulado, desrespeitado, expulso e até mesmo assassinado em seu habitat, destituindo-o de sua vida e cultura:
Todos são extremamente vulneráveis a doenças comuns como a gripe ou o resfriado que são transmitidas por pessoas de fora e para as quais os índios não apresentam resistência imunológica: esses são bons motivos para evitar o contato. Mesmo neste cenário sombrio, algumas histórias notáveis de sobrevivência têm surgido. Karapiru, um homem Awá, sobreviveu a um ataque de homens armados e, durante dez anos, morou sozinho, se escondendo na floresta, até que, um dia, ele finalmente fez contato com alguns colonos e agora vive com outros Awá. As tribos isoladas do Brasil devem ser protegidas e terem seus direitos à terra reconhecidos antes que elas, juntamente com as florestas das quais dependem, desapareçam para sempre”. (Os índios isolados. Consultado em 27 de setembro de 2017 em: https://www.survivalbrasil.org/povos/indios-isolados-brasil).


No dia 21 de setembro de 2017 foi a vez dos órgãos da ONU e da OEA denunciarem o massacre a indígenas isolados na Amazônia. Evidenciou-se um aumento da violência contra o povo isolado da região. Testemunha-se, diuturnamente, atos de um governo de legitimidade contestada que estimula o latifúndio, o agro-negócio de qualquer tipo e a qualquer preço, tendo, há pouco e em nome de interesses escusos, planejado a destruição da floresta via decreto. Ainda preza o esvaziamento da Funai e silencia, em cumplicidade, face à atual maldade materializada com incursões e ataques em terras dos indígenas isolados realizados por garimpeiros, produtores e extrativistas de madeira ilegais. Em vez de omissão e cumplicidade com o lado forte e desonesto da população pseudo-cristã, o governo deve tomar para si o compromisso em defender os direitos dos povos indígenas, em ato humanitário, seja este um desafio do tamanho que for.