POLIS

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O projeto nasce com foco no comportamento político nas sociedades contemporâneas e nos efeitos dos movimentos sociais e políticos atuais sobre as liberdades e processos emancipatórios, bem como seus impedimentos em escala local, nacional e global. Tem por objetivos o desenvolvimento de um campo interdisciplinar de reflexão e prática investigativa e divulgadora, reunindo debates em torno de questões como: preconceito, racismo, sexismo, xenofobia, movimentos sociais, violência coletiva social, relações de poder, movimentos emancipatórios de povos e nações, valores democráticos e autoritarismos, laicidade, análises de discursos e ideologias, de universos simbólicos e práticas institucionais. Nessa perspectiva, o Polis atua desde sua criação formal em 2013, como projeto de extensão e em 2015 como Blog para divulgação e atualização.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

A última colônia

 



                                Mapa do Sahara Ocidental


A população do Saara Ocidental enfrenta a violência da guerra contra o Marrocos que deseja anexar o território, enquanto os sahauarís reivindicavam independência. Grande parte da população sahauarí teve que fugir para o país vizinho, a Argélia, por não ter como resistir à violência do exército marroquino, maior e mais bem treinado do que os combatentes da Frente Polisário. O conflito armado que durou de 1975 a 1991 com efeitos permanentes se reacende com a violação do acordo de paz, pelos marroquinos, em novembro de 2020.


O Saara Ocidental é um país localizado na África Setentrional, que se limita a norte pelo Marrocos, a leste pela Argélia, a leste e sul pela Mauritânia e a oeste pelo Oceano Atlântico, onde ainda faz fronteira marítima com as Ilhas Canárias (Espanha). A sua capital é El Aiune. Com seus 266.000 km² o Saara tem aproximadamente o tamanho do Reino Unido (242.495 km²) e do estado de São Paulo (248.209 km²). O povo original, os saharauís, é refém de uma violenta ocupação de seu território pelo Marrocos, que ocorreu imediatamente depois de conquistar sua independência dos colonizadores espanhóis em 1975. Em vez de festejar sua libertação das amarras coloniais tornou-se, por meio da força dos invasores marroquinos, a última colônia no continente africano. Há mais de quarenta anos o povo saharauí continua sua luta para recuperar a independência conquistada após a saída dos espanhóis. Uma luta desigual e complexa quando se compara o poderio bélico do Marrocos e o da Frente Polisário (acrônimo de Frente Popular para a Libertação de Saguia el-Hamra e Rio do Ouro) que luta para a libertação do país e recentemente voltou a declarar guerra ao Marrocos. Por outro lado, testemunha-se a falta de apoio internacional para a luta sahauarí que se deve a interesses específicos dos diferentes países com participação direta ou indireta no conflito. A Espanha divide sua fronteira marítima ao sul com o Marrocos e depende do país africano para conter os avanços dos milhares de imigrantes ilegais que tentam atravessar essa fronteira; a França, que colonizou o Marrocos e manteve boas relações com o país posteriormente funciona como um apoiador para que não se concretize a consulta sobre a independência; outros países, incluíndo o Brasil, não querem deixar de fazer negócios com o Marrocos, nem mesmo se tratando da aquisição do fosfato explorado ilegalmente em suas terras ou do pescado dos mares sahauaris, o que para a população local é considerado um roubo que contribui para seu empobrecimento enquanto enche os bolsos dos generais marroquinos e do rei Mohammed VI: "O Saara Ocidental não será um território autônomo até a descolonização. Portanto, qualquer presença de empresas internacionais ou acordos com o ocupante marroquino são ilegais de 1975 até hoje. Qualquer exploração dos recursos naturais no Saara Ocidental sem o consentimento do povo saharauí é ilegal e é um roubo. Exigimos dessas empresas que parem de saquear nossos recursos até o fim do conflito, pois o dinheiro dos investimentos no Saara Ocidental vai para os bolsos dos generais marroquinos e do corrupto rei Mohammed VI, que ocupam nosso território ilegalmente. Exigimos que todas as empresas deixem nosso território imediatamente, especialmente neste atual estado de guerra”.(1) Apenas a Argélia continua apoiando a luta dos vizinhos e mantém em seu território vários acampamentos para o povo sahauarí que foge das armas letais e das minas instalados pelos invasores marroquinos. Desses acampamentos, em uma espécie de governo de exílio, saem as diretrizes dos seus líderes para a continuação da luta pela liberdade. Enquanto isso, para conter os revolucionários independentistas, o Marrocos desenvolveu a conhecida política de ocupar o território com seu povo e assim enfraquecer a população local. Quando ainda não fazia um ano da ocupação já haviam sido deslocados pelo menos 350 mil marroquinos para ocupar cidades sahauarís. "A ONU, que acompanha o caso há muito tempo, propõe que seja feito um referendo de autodeterminação para decidir sobre a independência. O Saara Ocidental pede que o referendo seja realizado com a população que já vivia no país em 1974, antes da ocupação marroquina ter início. O Marrocos, contudo, deseja uma consulta com toda a população, que inclui a grande parcela de marroquinos que ali vivem”.(2) Chaba Seini Brahim, integrante da União Nacional das Mulheres Saharauis (UNMS) e da Marcha Mundial das Mulheres fala sobre o caráter patriarcal e violento da ocupação marroquina desde seu início em 1975.  Segundo Brahim, sempre atuaram repressivamente e com mão de ferro contra os cidadãos saharauís e ativistas de direitos humanos, o que se intensificou ad extremum quando a Frente Polisário declarou guerra em novembro de 2020, depois que o exército marroquino violou o acordo de paz ainda vigente. "A maioria dos nossos ativistas saharauís estão em prisão domiciliar obrigatória, com a polícia na porta de suas casas. A intimidação é tamanha que esses ativistas não podem nem receber visitas ou sair de casa sem serem seguidos pela polícia”.(3) A militante afirma que na comunidade internacional não há resposta à altura das preocupações com a integridade do povo detido e com as violações de direitos humanos que atingem a todos. Também se queixa do pífio efeito do mandato da Minurso (Missão das Nações Unidas para o Referendo do Saara Ocidental) que deveria servir para implementar a consulta sobre a independência, proteger o povo sahauarí e os direitos humanos em sua missão no Saara Ocidental mas apenas cria esperanças para uma solução pacífica do conflito que nunca vem.  Por essa razão a ONU cai, cada vez mais, no descrédito da maioria dos saarauís, que perdem a confiança no processo de paz, o que aumenta a sensação de abandono com relação à comunidade internacional, e o temor da inevitabilidade da guerra.(4) Para o ativista de direitos humanos Jamaa Baih, a Espanha é a principal responsável pela ocupação marroquina e pelo atual conflito que, segundo ele, só deve terminar quando o referendo prometido pela ONU há quase trinta anos trouxer a libertação completa dos territórios sob ocupação marroquina. 


Antonio Caubi Ribeiro Tupinambá

Fortaleza 19 de fevereiro de 2021.


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1) CAPIRE. A luta da mulher no Saara Ocidental: ativista traz a luta de um povo sob ocupação. 2021. Disponível em: <https://www.brasildefato.com.br/2021/02/18/ate-que-nossos-territorios-sejam-livres-mulheres-do-saara-ocidental-em-luta>. Acesso em 18 fev. 2021.

2) SANZ, B. Entenda o conflito do Saara Ocidental, a última colônia africana. 2018. Disponível em: <https://noticias.r7.com/internacional/entenda-o-conflito-do-saara-ocidental-a-ultima-colonia-africana-23092018)>. Acesso em 18 fev. 2021.

3) CAPIRE. A luta da mulher no Saara Ocidental: ativista traz a luta de um povo sob ocupação. 2021. Disponível em: <https://www.brasildefato.com.br/2021/02/18/ate-que-nossos-territorios-sejam-livres-mulheres-do-saara-ocidental-em-luta>. Acesso em 18 fev. 2021.

4) O fracasso da missão de paz da ONU no Saara Ocidental. 2017. Disponível em: <https://www.cartacapital.com.br/mundo/o-fracasso-da-missao-de-paz-da-onu-no-saara-ocidental/>. Acesso em 18 fev. 2021.


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