POLIS

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O projeto nasce com foco no comportamento político nas sociedades contemporâneas e nos efeitos dos movimentos sociais e políticos atuais sobre as liberdades e processos emancipatórios, bem como seus impedimentos em escala local, nacional e global. Tem por objetivos o desenvolvimento de um campo interdisciplinar de reflexão e prática investigativa e divulgadora, reunindo debates em torno de questões como: preconceito, racismo, sexismo, xenofobia, movimentos sociais, violência coletiva social, relações de poder, movimentos emancipatórios de povos e nações, valores democráticos e autoritarismos, laicidade, análises de discursos e ideologias, de universos simbólicos e práticas institucionais. Nessa perspectiva, o Polis atua desde sua criação formal em 2013, como projeto de extensão e em 2015 como Blog para divulgação e atualização.

domingo, 2 de maio de 2021

A POESIA NO TAJ MAHAL






"Sarita e Arkht" nossos protagonistas do seriado netflix "Taj Mahal 1989" (1). Um casal inter-religioso, ela hindu e ele muçulmano.



“Não achamos o amor onde procuramos”



Tudo o que pode se amar e se odiar no país, para mim, mais fascinante daquela região asiática se encontra, figurativamente, nessa short story dividida em pequenos e poucos capítulos, que podem ser vistos de uma ou duas vezes.

A riqueza das especiarias que ainda hoje estão por aqui levaram os portugueses a navegar por "milhas e milhas a qualquer lugar”, conquistar o mundo, com sua rota pioneira à Ásia, como os primeiros europeus a chegar a países no Oriente.

A beleza autêntica das vestimentas que se somam às ainda mais belas formas de pratos e menus e, no filme, aos arroubos filosóficos existenciais em uma mescla de pensamento ocidental e oriental só resultam em fascínio.



                                                            Taj Mahal - Agra (Índia)

 As paisagens vão desde os templos e palácios imponentes, aos vilarejos com suas choupanas, ou à sarjeta das grandes cidades com seu lúmpen em abundância, parte inseparável dessa paisagem. Pauperização e servidão humana se misturam a ricos filigranas que enfeitam objetos, tornam singelos os movimentos e belos os diálogos. Enfim, um complexo emaranhado que revela a dimensão da nação indiana, a resistência de sua cultura mesmo depois da devastação dos colonizadores britânicos, cuja presença se faz sentir em certas "impurezas" que restaram na língua.

Costumes e religião permeiam os diálogos, os muitos gestos e rituais, sejam eles sacros ou profanos. O machismo sustentado pela cultura milenar, exacerbado pela presença colonial continua a definir as relações sociais com forte segregação e submissão feminina. No entanto há também, nesse mosaico cultural, a esperança e o respeito das relações inter-religiosas pouco vistas nesse mundo acostumado ao sectarismo.

Misturam-se, portanto, a singeleza de gestos e hábitos cultivados, a preocupação em manter o belo acima da decadência urbana e muitas vezes humana, ainda que em cenários reveladores de empobrecimento, desigualdade; pouco caso aos desvalidos e aceitação da miséria para muitos e poder para alguns como um fato, um destino. 

Não se perde o fascínio nessas adversidades e desequilíbrio social. 

Diálogos embebidos em poesias, filosofia e pragmatismo; a vida acadêmica sempre presente, amizades e romances à indiana se sobressaem na história às vezes entremeada por pequenos lances de narrativas, dando-lhe um toque bollywoodiano.



Cores, paladares, odores, sentidos que afloram nesse enredo;  fotografias realistas, em movimento, passando pela arquitetura, riqueza e miséria, ruas, casas, vielas, jardins e palácios que enchem os olhos. 

Viaja-se com os personagens por diferentes cidades indianas com registro da vida como ela é, distante da vida como o turista vê.

Um professor de filosofia com uma pena que também cria a poesia e está casado com uma professora de física que apenas repete cálculos enfadonhos para alunos desinteressados, tem a missão de reavivar um casamento falido. Um outro filósofo “medalhista de ouro”, que pelo desemprego vira alfaiate, vive com uma ex-prostituta e traz na sua história a esperança da superação que contradiz seu destino. A menina comunista que vence a acirrada corrida pela presidência do grêmio universitário e o vence para um machista irremediável e egocêntrico que tinha o apoio da máfia local. 

Exemplares e exemplos de uma Índia dos anos 1980, seu ritmo e seus rituais de sobrevivência. 

Diferentemente da ideia que a medíocre imprensa nacional brasileira e os fascistas fazem romantizando a volta do fogão à lenha, nessa short story o chá que se oferece às visitas é aquecido na brasa e significa autenticidade, tradição e necessidade. 

A riqueza da cozinha indiana penetra os mais remotos rincões e, quando há o que fazer, o que há se transforma, magicamente, em imagens gastronômicas que enchem os olhos e aguçam o paladar. 

Há, na opressão introjetada, os contrastes fortes, muitas vezes extremos entre singeleza e arrogância, consideração e desprezo, amor e ódio que se intercalam e emergem nos diversos temas presentes e tratados no filme.

A venda de meninas para o mercado de prostituição, o machismo impregnado que leva à mutilação e à morte, a falta de perspectivas de vida e de futuro desenham um mundo para muitos apenas selado em um destino imutável e inexorável. Tudo se opondo ao aroma e à beleza da gastronomia milenar, à magnitude da arquitetura, à arte   deslumbrante, aos recantos sagrados de deusas e deuses, à leveza gestual, ao doce idioma que sempre remete a nomes e gosto de frutas, à forma e ao cheiro de flores; à estética da beleza transcendente, à sutileza no amor, às vezes tímido, outras platônico.

Para quem espera linearidade, cronicidade e “ocidentalização”, desaconselho. A Índia não é para iniciantes. Ainda assim, para esses, espero que assistam e consigam perceber que o mundo, nesse caso não é, ao contrário do que se diz, “un pañuelo”. O belo vai além do que se limitou como tal entre Roma e Atenas, ou do que é visto por olhos ocidentais viciados e prepotentes. 

Como disse nosso professor Sudakha Mishar em sua primeira aula na universidade de Lucknow, onde se passa a maior parte da história: “A compreensão é binária, 0 ou 1. Compreende-se ou não”. Isso também pode valer para quem quer compreender a Índia.


Antonio C. R. Tupinambá

Fortaleza, 2.05.2021.


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(1) Taj Mahal 1989 é uma série indiana de comédia e romance na web, dirigida e escrita por Pushpendra Nath Misra. A série é estrelada por Neeraj Kabi, Geetanjali Kulkarni, Sheeba Chaddha e Danish Husain

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