Ao norte vivem os
turcos, ao sul os gregos e no meio, dividindo os dois povos, uma faixa de
"terra de ninguém" controlada pela Organização das Nações Unidas
(ONU), cujo acesso é proibido para os dois grupos populacionais. Os dois povos,
com língua e religião diferentes vivem conflitos étnicos que remontam aos impérios
bizantino e otomano. No ano 1959 houve negociações que envolveram as diversas
partes do conflito e levaram a um acordo para a concessão de uma Constituição
que tornasse o Chipre uma república independente
da Comunidade Britânica, tendo seu funcionamento garantido pela Inglaterra,
Turquia e Grécia. No ano seguinte, o Chipre, a Grécia e o Reino Unido assinam um tratado que declara a independência da ilha, o qual previa para os britânicos a soberania das bases de Acrotíri e Deceleia. A
independência foi proclamada em 16 de agosto de 1960, sendo eleitos presidente o greco-cipriota Makarios, arcebispo
ortodoxo; e vice-presidente, o turco-cipriota Fazil Kuchuk. No entanto, tudo isso não pôs fim a violência e conflitos entre as partes turca e grega. Makarios era presidente, sob uma Constituição que
indicava a vice-presidência para os turco-cipriotas, com poder de veto, o que
dificultou o funcionamento do Estado e as relações inter partes, culminando em arroubos de violência e explosões de ódio nos anos1963 e 1967. Em dezembro de 1963, as comunidades turca e
grega da ilha
entraram em conflito quando o presidente propôs alterações constitucionais que pressupunham a
supressão do direito da minoria turca de
exercer o veto legislativo. Os turco-cipriotas vislumbravam
a divisão da ilha, enquanto os greco-cipriotas
insistiam na existência de um Estado unido com garantias dos
direitos das minorias nacionais. Em 1964 o governo entrou em colapso e uma força de paz da ONU teve de intervir.
As nações mães, Turquia e Grécia divergem, há décadas,
no que tange a questões geopolíticas na região. Tampouco a Grã-Bretanha, sua nação
colonizadora até o início da década de 1960 deixou totalmente o Chipre, onde
ainda mantém duas bases militares até os dias de hoje. A ONU, responsável pela
paz mantida, a duras penas, entre os povos da ilha, não reconhece uma República
Turca do Chipre do Norte e por isso, somente o governo da capital Nicósia, ao
sul, representa oficialmente a ilha. Apenas o sul, com seu governo apoiado pela
Grécia, é parte do bloco político econômico que forma a União Européia (EU). Apesar de desde de
2004 toda a ilha ser país membro da União Europeia, somente na parte grega
valem os direitos e deveres inerentes à EU para seus países membros. Esse é o quadro da situação nessa ilha e nação conflituosa que, segundo a
mitologia grega foi o berço de Afrodite, deusa da beleza e do amor.
A sua parte grega ainda é hoje destino preferido para muitos turistas, principalmente europeus. A
última tentativa de unir a ilha em um só Estado remonta ao ano de 2004, quando
sob a coordenação do então secretário geral da ONU, Kofi Annan desenhou-se um
acordo com esse objetivo. A proposta foi rejeitada pelo presidente em exercício
do Chipre grego na altura do acordo, levando ao recrudescimento do problema e a
animosidade entre seus povos. No entanto, Nikos Anastasiades, atual presidente
do Chipre grego, vê como
plausível uma solução que fortaleça o papel regional do país e que contribua para a
estabilidade na região em que se localiza, nomeadamente, o Nordeste do
Mediterrâneo e países adjacentes como Turquia, Líbano, Síria, Israel e Egito.
Após os últimos 43 anos de busca de uma resposta à questão cipriota sem resultados
concretos, vê-se
uma luz no fim do túnel com a iminente rodada de negociações em Genebra que
contará com a participação de representantes dos dois lados da ilha, além de
outros nomes ligados à ONU e
à União Europeia. O grande problema para a
implementação de um projeto que una os cipriotas em um Estado único, soberano e
com autonomia regional relativa se chama Recep Tayyip Erdogan, presidente turco
afeito a decisões autoritárias e incompatíveis com o modelo democrático
europeu. Erdogan se encontra por trás do atual líder da parte turco-cipriota,
Mustafa Akinci, o que traz desconfiança quanto ao seu eventual papel no caso do
estabelecimento de uma nova realidade geopolítica pós-união. A ideia de um
Estado federativo cipriota com dois estados autônomos pode ter efeitos
imprevisíveis, tendo em vista o status de membro da União Europeia do Chipre
grego, que poderia ser estendendo a toda ilha e população. Portanto fica
difícil prever se, nessas circunstâncias, uma reunião da ilha ainda se faz possível.
A República do Chipre não reconhece o país do norte e vice-versa. O líder turco-cipriota, por seu turno, afirma
que a República do Chipre, na
sua configuração atual, está morta e que somente um sistema político com uma federação turco/greco-cipriota viabilizaria uma união que
ainda em outros moldes, já era cogitada na época do seu maior líder, o ex-presidente arcebispo Makarios. Daí
poderia renascer um Chipre em forma
de Estado-nação unificado e respeitando as diferentes minorias locais, cuja
capital Nicósia, representaria todo o seu povo.
BERLIM, 13 de janeiro de 2017.
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